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quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Carteirinha de pacientes que fizeram cirurgia bariátrica permite desconto em alguns restaurantes

Um projeto de lei que tramita desde o ano passado na Câmara Legislativa quer garantir que pessoas que fizeram cirurgias de redução de estômago tenham o desconto de 50% nos rodízios

Quando a orientadora educacional Luciana Santos,  42 anos, vai a um restaurante, costuma comer muito pouco. Há sete anos, ela fez uma cirurgia bariátrica e, com o estômago reduzido, uma maçã pequena já a sacia por horas. Em alguns estabelecimentos, quando apresenta uma carteirinha oferecida pelo próprio médico a identificando como operada, ela ganha um desconto como gentileza. Isso pode se tornar obrigatório.
Um projeto de lei que tramita desde o ano passado na Câmara Legislativa quer garantir que pessoas que fizeram cirurgias de redução de estômago tenham o desconto de 50% nos rodízios, bufês livres ou serviços similares no Distrito Federal. Nos estabelecimentos que oferecem pratos individuais, a ideia é que sejam obrigados a disponibilizar meia refeição ou porção. Outra alternativa é que a cobrança seja feita por pesagem, caso seja opção do cliente. Algo semelhante já ocorre em Campinas (SP) e Porto Alegre (RS). 
“Acho que é justo, desde que o paciente seja consciente e não se aproveite para desperdiçar.  Muitos lugares já colocam isso como argumento. Se vou em uma pizzaria, por exemplo, como no máximo dois pedaços e pronto. Não vou ficar pegando várias fatias para comer a pontinha e degustar”, observa Luciana. Para ela, se não cabe no estômago, não justifica pedir grande quantidade. “Depois tudo vai para o lixo”, diz. 
Luciana perdeu 43 quilos e conta que  quando vai a rodízios, “sempre me apresento com a carteirinha e pergunto se há preço diferenciado. Normalmente não sabem o nem que é um paciente bariátrico. Alguns, de imediato, falam que não trabalham com descontos. Outros consultam o superior”.  Ela  já pagou metade do valor ou preço infantil em   estabelecimentos   que oferecem comida japonesa, mexicana ou churrasco, por exemplo.

Benefício nem sempre é divulgado
O gestor público Sosthenes Paz, 35 anos, perdeu 32 quilos depois de ser submetido à cirurgia bariátrica. Atualmente, mesmo sem conseguir comer grandes quantidades de comida, confessa que evita expor a situação, mesmo diante da possibilidade de obter um desconto em restaurantes. 
“Não chego a negociar, mas há locais bastante solícitos que  dão o desconto amigavelmente”, conta. Para ele, uma lei que de fato estabeleça o desconto  evitará constrangimento.

Identificação 
Uma preocupação dos comerciantes é como identificar os operados. “A pessoa também não pode chegar falando que fez a cirurgia bariátrica pedindo desconto. Como vou saber se é verdade?”, questionou Pablo Duarte, 29 anos, proprietário do Capital Chicken, um restaurante que serve pratos executivos. “É preciso ter algum inciso que obrigue o cliente a comprovar a operação”, pediu Regivaldo de Abreu, da pizzaria Pizza à Bessa. 

No Projeto de Lei 1855/2015, de autoria da deputada Celina Leão (PDT), há essa condição. A utilização do desconto, prevê o texto, depende de comprovação médica. Desde 2011, as pessoas que passam por cirurgia de obesidade têm direito a uma carteirinha do tamanho de uma cédula de identidade, informando qual a operação foi realizada.  O documento é emitido pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e  permite que este paciente possa ser atendido adequadamente em hospitais.

Basta pedir ao médico
A intenção da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica  (SBCBM) quando lançou a carteirinha era oferecer mais segurança a essas pessoas quando fossem atendidas por outros médicos, em emergências, por exemplo. Mas também serve para comprovar a cirurgia. Ela deve ser solicitada no consultório médico onde o procedimento foi feito, a um custo de cerca de R$ 20. 

Com ela, os pacientes conseguem os descontos antes mesmo de haver uma legislação obrigando a atitude. “Nunca sabemos onde realmente tem. Eu costumo apresentar a carteirinha e perguntar se há preço diferenciado. Já consegui em muitos lugares e, na mesma proporção, tive negativas. Também já me senti constrangida”, contou a analista de sistemas Letícia Martins, de 34 anos. 

Certa vez, se surpreendeu. Em um  rodízio de comida japonesa, comentou com o garçom que a levasse pouca comida, já que, por causa da redução de estômago, não poderia consumir muito. “Ele disse que se eu tivesse a carteirinha, pagava mais barato. Na hora da conta, me cobrou o valor referente às crianças”, lembra. Para ela, esse tipo de atitude valoriza o cliente. 

Comerciantes divergem sobre possibilidade
 Regivaldo de Abreu,   da pizzaria Pizza à Bessa, conta que é comum receber questionamentos a respeito dos valores para pessoas que passaram por operações de redução de estômago no estabelecimento. “Mas ainda não aderimos a nada em relação a isso”, adianta. Isso não quer dizer que há uma política dura em relação aos preços: “Já percebemos que o cliente não consumiu tanto e fizemos um desconto. É tudo na conversa”. 

No caso de uma lei, diz, “sou completamente a favor, porque quem faz esse tipo de cirurgia tem que seguir uma dieta, mas nem por isso  deve deixar de sair com os amigos ou ter uma vida social por ter que pagar mais por algo que nem pode consumir. Se houver regulamentação, é válido”. 

Para Pablo Duarte, do Capital Chicken, no entanto, uma regulamentação mudará a estrutura do restaurante. “Contratamos consultores e engenheiros alimentares para criarem os pratos. Vou ter que refazer todo o cardápio, chamando outros profissionais para repensar a refeição com outra tabela nutricional”, prevê. Por outro lado, “isso pode incentivar que esse tipo de cliente, que não costuma vir, passe a frequentar o restaurante. Além de evitar o desperdício”. 

Opinião contrária
A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) é contra o projeto. “A matéria-prima não constitui a maior parte do custo do prato, mas representa 30%. Lá está o aluguel, o serviço, a mão de obra...  todos os custos da casa”, explica o presidente Rodrigo Freire, que considera preconceito dar um desconto de metade do valor para alguém operado. 
De acordo com ele, caso seja aprovado, pode pesar no bolso de quem paga integralmente. “Se um paga menos, o outro tem que pagar mais, para compensar”, alerta. 

pontodevista
Para Luiz Fernando Córdova, especialista em cirurgia do aparelho digestivo com foco especial na Cirurgia Bariátrica e Metabólica, o projeto de lei deve ser ponderado. “Há cirurgias que não deixam o estômago propriamente pequeno e outras   permitem que a pessoa volte a comer uma quantidade parecida com a que um adulto pequeno consome.

E, assim, seria injusto com o comerciante”, diz. O desconto seria justo para técnicas e alimentos específicos e nos primeiros anos pós-cirurgia. “Há mais restrição à proteína. Então, em uma churrascaria faz sentido ter o desconto. Mas, em rodízios de massa, o consumo é bem próximo ao normal, então não justificaria”, exemplifica.   

Fonte: Da redação do Jornal de Brasília

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